ENTREVISTA: Jason, uma história de luta e superação
Conheça a história do nogueirense que teve 80% do corpo queimado quando tinha três anos de idade e que já passou por 87 cirurgias plásticas
“Me considero um guerreiro por tudo que passei na vida” (Jason)
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Alex Bússulo
Difícil encontrar alguém em Artur Nogueira que não conheça o Jason. Este nogueirense possui uma incrível história de vida e superação. Quando ele era pequeno teve 80% do corpo queimado em um acidente.
Ainda criança foi adotado por uma enfermeira que morava em Artur Nogueira. Foi aqui, no município Berço da Amizade, que ele construiu a vida. Passou por muitos desafios e enfrentou muito preconceito.
Na entrevista desta semana fomos conhecer a história de Everson do Nascimento Soares, o “Jason”, como ele mesmo gosta de ser chamado. “Foi um grande amigo, o Marcelo Rosada, que me deu esse apelido. Por causa do Jason do filme mesmo [risos]. Existe o Jason mal e o Jason bonzinho. Ganhei esse apelido quando era criança, na época da escola. Nunca me importei com ele, pois sabia que quem havia colocado era uma pessoa que gostava de mim. Hoje, em toda a região o pessoal me trata por Jason. As mais próximas ainda me chamam de ‘Jeje’”, afirma nosso entrevistado.
Jason nasceu em Curitiba, Paraná, há 38 anos. De família pobre, ele vivia com os pais, além de 6 irmãos. Até os 3 anos de idade, ele teve uma vida normal. Até que aconteceu um grave acidente que marcaria para sempre a vida dele. “Havia um carro velho e abandonado próximo a minha casa. Eu, minha irmã e uma amiga fomos até ele para brincarmos. Entramos e minha amiguinha encontrou uma caixa de fósforo. Ela acendeu e acabou colocando fogo no carro. Houve uma explosão e fui lançado para longe do carro em chamas”, conta Jason.
A irmã e a amiga dele não resistiram as queimaduras e morreram. Jason foi internado em estado grave. Ficou vários dias em coma. Os médicos falavam que apenas um milagre o salvaria.
Jason conta que os dias passaram e o seu próprio pai, em um momento de desespero, tomou uma atitude radical. “Eu já estava fora de coma, mas não progredia. Meu pai foi escondido até o hospital onde eu estava e, sem que ninguém soubesse, me enrolou em uma blusa e me tirou de lá. Me contam que nem minha mãe sabia disso. Até a polícia foi acionada. Ele pegou um ônibus e veio para a grande São Paulo, em busca de ajuda médica. Foi quando eu fui internado no Hospital das Clínicas e iniciei um novo tratamento”, conta.
Muitos dizem que são nos momentos mais difíceis em nossas vidas que encontramos pessoas especiais, que são verdadeiros anjos enviados por Deus. Foi neste hospital, em São Paulo, que Jason encontrou uma mulher que mudaria para sempre a vida dele. “Havia uma enfermeira muito bondosa, que tinha um carinho especial por mim. Ela se chamava Ana Panagassi de Oliveira e ficou comovida com a minha história. Eu era uma pobre criança, de três anos e alguns meses. Minha família não tinha condições financeiras e sofria para viajar de Curitiba para São Paulo. Então, por obra divina, essa enfermeira decidiu cuidar de mim. Praticamente me adotou. Depois disso comecei a morar com ela e com a família que ela tinha aqui em Artur Nogueira. Se não fosse ela não sei o que teria acontecido comigo. A considero como minha verdadeira mãe”, afirma Jason, que morou com dona Ana até os 22 anos de idade.
Mesmo com várias cicatrizes, Jason tentou levar uma infância normal. No período escolar ele fez muitas amizades, mas também sofreu bullying. “Eu estudava na escola Amaro e guardo muitas recordações boas. Infelizmente, alguns colegas davam risadas da minha situação. Isso me deixava muito triste. Como criança, e na fase da adolescência, não era fácil lidar com algumas gozações. Dividia o período entre a escola e o hospital, pois ainda tinha que fazer o tratamento. Tinha vez que eu chegava embrulhado na classe, e os colegas zoavam. Me chamavam de múmia, entre outras coisas. Na maioria das vezes eu acabava tolerando, mas chorava bastante. Teve uma época em que fiz um implante de sobrancelhas e não queria ir na escola, mas minha mãe insistiu. Quando cheguei na classe, um colega me chamou de Huck. Pedi para professora deixar eu ir ao banheiro. Fui chorando e retirei toda a sobrancelha. Não foi fácil”, relembra.
Mas não foi apenas na infância que o nogueirense sofreu preconceito. “Quando eu era criança sentia que alguns colegas tinham bastante medo de se aproximar de mim, me esnobavam. Mas, até hoje eu sinto esse preconceito. Querendo ou não eu sou diferente”, afirma.
Jason conta ainda que há alguns anos voltou a morar em Curitiba, para tentar uma vida melhor. “Voltei para a cidade em que nasci, onde vive minha família biológica. Mas a realidade que passei por lá foi mais dura que esperava. Foi nessa época que conheci minha esposa e tive minha filha, que hoje tem 10 anos de idade, minha joia. Para sustentar a família, cheguei a trabalhar em algumas empresas, mas no final tive que trabalhar coletando papelão na rua. Como sempre, não foi fácil. Mas sabia que não podia desistir”, recorda.
Depois de alguns anos em Curitiba, Jason retornou para Artur Nogueira, onde vive até hoje em uma casa no Jardim Sacilotto. Ele paga aluguel e diz que seu maior sonho é ter uma casa própria. “É o sonho de qualquer um. Mas é difícil juntar o dinheiro. Mas, tenho fé que em algum dia vou conseguir realizar esse sonho”, afirma.
Dona Ana, a enfermeira que o adotou, já faleceu há alguns anos. Jason ainda mantém contato com os irmãos adotivos.
Há cerca de 5 anos ele descobriu a paixão pelo mundo das lutas. Começou praticando Kung Fu e hoje é faixa azul em Jiu-jitsu. “Sempre gostei de esportes. Treino todos os sábados aqui em Artur Nogueira. Quero conquistar novas faixas e continuar disputando campeonatos em nossa região”, afirma.
Foto: Arquivo Pessoal
Jason conta que já passou por 87 cirurgias plásticas por todo o corpo. Segundo os médicos ele deveria fazer outras, mas o nogueirense diz que não pretende mais passar pelas cirurgias. “Hoje, eu estou bem. Me sinto bem e com muita saúde. Não quero mais passar por novos tratamentos e voltar a sentir dores”, afirma.
Ele conta que tem muita fé em Deus. “Sinto Deus dentro de mim. Sou um cara que busca Deus todos os dias, sem ele eu não seria nada. Já me questionei porque isso aconteceu comigo, mas nunca desisti da vida. Desistir é para os fracos. Aqueles que desistem são pessoas fracas, de espirito e de coração. A vida é bela, quem complica ela somos nós. É igual no Jiu-jitsu, existem várias quedas, mas elas nos deixam cada vez mais fortes”.
Essa é a vida de Jason. Um nogueirense que luta todos os dias, não apenas no tatame, mas na vida, enfrentando preconceito e em busca de uma vida melhor. “Me considero um guerreiro por tudo que passei na vida. Sofri muita discriminação, preconceito, mas não desisti nunca. Vou continuar lutando e acreditando na vida, sempre”, conclui Jason.
Fotos: Gregory Pereira
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